O que é mais importante no Evangelho segundo Mateus são: As 5 falas, as 5 palavras, os 5 discursos, os 5 sermões ou as 5 catequeses.
Os judeus têm a Lei de Moisés nos cinco livros do Pentateuco: Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio.
O que interessa para Mateus é o texto do PENTATEUCO cristão.
As outras coisas como as narrativas de milagres ou as discussões com os inimigos de Jesus fazem parte do Evangelho como as iluminuras em muitos livros antigos, pequenos desenhos ou miniaturas que floreiam e destacam o texto desses livros.
1) O EVANGELHO CONQUISTADOR.
Janela
O Evangelho de Mateus nos seus trechos narrativos segue Marcos de perto. Mas,
modifica o episódio quando Marcos, no simbolismo de suas narrativas, insinua alguma
crítica aos judeus.
É o caso da sinagoga (a igreja dos judeus) onde Jesus fala com autoridade e não
como os escribas que eles tinham. Lá dentro está um espírito mau, que Jesus expulsa.
Mateus nem toca no assunto.
Outro é o episódio do paralítico. Em Marcos, simbolizando os não judeus, os dos
quatro cantos do mundo, quatro carregam o paralítico. Eles querem chegar até Jesus,
mas são impedidos pelos que estão na casa (a comunidade), onde os escribas estão
sentados (ensinando). Os quatro, impedidos de entrar pela porta, sobem ao teto e fazem
o paralítico chegar até onde Jesus está. Em Mateus Jesus não está na casa e não são
quatro que carregam o paralítico, só há uma cura de paralítico, sem os detalhes
simbolicamente polêmicos de Marcos.
As Comunidades Apostólicas
Havia três grupos de judeus: um é o daqueles que seguiam os Rabinos fariseus
que reorganizavam o judaísmo. Outro é o dos cristãos judeus do Evangelho segundo
Mateus. No meio havia outro grupo, o dos judeus que nem eram cristãos nem seguiam
os fariseus.
O Evangelho de Mateus pretende conquistar esses judeus para a fé em Jesus. Ele
não pode, por exemplo, insinuar nada que diga que Jesus abandonou a religião judaica.
Ele só manda missionários “às ovelhas perdidas da casa de Israel”. Usa de todos os
recursos para não ofender, antes para agradar os judeus.
Por outro lado, vacina seus leitores contra os Rabinos fariseus. No capítulo 23,
mesmo dizendo que eles têm autoridade para explicar a Lei de Moisés, Jesus os chama
de hipócritas inúmeras vezes.
As comunidades de hoje
É preciso motivar as pessoas para que participem de algum encontro ou reunião
semanal em torno da Bíblia como grupo de reflexão e/ou de nossas celebrações. Muitos
talvez não se interessem. Fazer que entendam que isso não vai modificar seus costumes
religiosos. Convencer a uma experiência será sempre bom. Em cada comunidade, com
cada pessoa, a maneira de agir pode e deve ser diferente, o importante é motivar.
Depois é importante não afastar as pessoas. Ter o cuidado para não ofender
ninguém, nem desfazer de seus costumes religiosos. Ficando com o grupo, a pessoa vai
aprender que muita coisa pode ser deixada de lado sem nenhum prejuízo para sua fé.
Enfim a pessoa vai se encantar, depois se apaixonar pelo seu grupo e pela comunidade e
não vai sair mais.
2) MATEUS , O CATEQUISTA.
Janela
O Evangelho segundo Mateus é organizado em torno de cinco grandes catequeses de
Jesus. Todos já ouviram falar no Sermão da Montanha. São três capítulos onde Jesus
fala da sua proposta, do projeto do reinado de Deus. É a primeira catequese. Além dela,
há (2ª) a catequese ou instrução para os missionários, vem depois (3ª) a que, em
parábolas, fala da realidade das comunidades, depois (4ª) a que fala da importância e de
como ser comunidade e (5ª) aquela na qual Jesus fala do fim.
As Comunidades Apostólicas
A comunidade ou rede de comunidades que nos deu o Evangelho teve muitas
dificuldades com os escribas ou Rabinos fariseus, agora, os donos da religião e até da
identidade judaicas.
A comunidade de Mateus era de judeus que queriam continuar judeus, mas
pretendiam conquistar para a fé em Jesus outros judeus que ainda não seguiam os
fariseus.
Precisavam ter clareza de ideias e saber como agir. Era necessário, então, que
tivessem bastante firmeza e que o ensinamento de Jesus lhes mostrasse o sonho e a
realidade, mostrasse o que Jesus quer e as dificuldades que podem aparecer. Seu
Evangelho tinha que orientar aqueles que levam aos outros a mensagem de Jesus. Devia
mostrar como Jesus viu a destruição de Jerusalém, um fim de mundo, o fim de cada um
e o julgamento decisivo da vida de todos, não só dos judeus.
Os judeus têm, na Bíblia, os cinco livros da Lei, a Torá, que quer dizer
Instrução. Os cristãos judeus têm as cinco catequeses ou instruções de Jesus.
As comunidades de hoje
Hoje há muitas coisas, não apenas propostas religiosas, que nos desviam do projeto e
dos rumos traçados por Jesus. O dinheiro é a primeira delas, se não a razão de ser de
todas as outras. Aliás, na primeira catequese de Jesus, o Sermão da Montanha, nós já
encontramos: “Vocês não podem servir a Deus e ao dinheiro!”.
A televisão e os meios de comunicação em geral estão todos a serviço do
consumismo, mandando a gente gastar, gastar, gastar. Cada um faz o que quer, faz
aquilo de que tem vontade. Quando deseja fazer algo, deve fazer. Para quê se reprimir,
conter seus impulsos? A gente tem que ser individualista. Isso tudo ajuda a consumir,
movimenta a economia, a única coisa que interessa.
Será essa a proposta e o caminho de Jesus? Hoje também será necessária uma
catequese, uma instrução firme e segura, baseada na vida e palavras de Jesus, e que
responda aos problemas que vivemos?
3) O EVANGELHO JUDEU.
Janela
O Evangelho segundo Mateus é o que tem maior número de citações da Bíblia. Tudo o
que ele relata é ilustrado com uma citação bíblica. Começa com a genealogia ou listas
dos antepassados de Jesus. Parte de Abraão, pai do povo judeu.
Jesus não veio destruir o Primeiro Testamento, a história, as tradições e a Bíblia do
povo judeu. Jesus veio realizar completamente tudo o que está na Bíblia, chamada
também de Lei e Profetas, pois eram as duas partes em que os judeus dividiam a Bíblia.
Como os judeus, esse Evangelho evita empregar a palavra Deus. É uma atitude de
respeito pelo nome santíssimo. Em vez de dizer “Deus”, diz “os Céus” no plural,
também maneira de falar dos judeus.
As Comunidades Apostólicas
A comunidade que nos deu este Evangelho começou em Jerusalém, logo após a morteressurreição
de Jesus. Tiago, chamado “irmão do Senhor”, foi a principal liderança
dessa comunidade. Ele tinha o apelido de “justo” e era realmente muito fiel à Lei
judaica. Converteu muitos judeus à fé em Jesus. Talvez por isso tenha sido morto.
No ano 66 os pequenos proprietários galileus que haviam perdido tudo e começaram a
formar grupos de assaltantes, agora chamados de “bandidos”, tomaram o poder em
Jerusalém. A comunidade cristã abandonou a cidade e saiu da Palestina. Continuou
migrando de um lugar para outro e, por volta do ano 85, escreveu o Evangelho segundo
Mateus.
Por fidelidade à sua fé judaica, para ler Jesus com os óculos dessa fé e para conquistar
os judeus, Mateus respeita e valoriza tudo o que é da sua gente. Por isso, cita a Bíblia,
usa o modo de falar dos judeus, coloca Jesus como realização completa de toda a Bíblia.
As comunidades de hoje
Nós caímos hoje na tentação de, sempre e em todo o lugar, dizer a mesma coisa.
Pensamos: “A verdade é sempre a mesma e deve ser dita sempre da mesma forma”.
Mas, quem acha que possui a verdade única e absoluta acaba falando para as paredes.
A realidade muda cada vez mais rapidamente. O que convinha dizer ontem, hoje já não
tem importância. Os problemas são outros e a resposta da Palavra de Deus também deve
ser outra.
Como para acender uma lâmpada não basta o fio que traz a corrente elétrica, é preciso o
outro que está bem enterrado no chão, assim o conhecimento teórico nunca vai acender
nossa luz se não estiver ligado ao conhecimento e observação da realidade.
4) O EVANGELHO DOS FUGITIVOS.
Janela
Só o Evangelho segundo Mateus fala da fuga para o Egito. Avisado por Deus, José pega
o Menino e sua mãe e foge para o Egito. Lá ficam até a morte de Herodes, que
aconteceu dois anos depois. Quando voltam, não vão para a Judéia, mas para a Galiléia
e, só então, vão morar em Nazaré.
Algumas coisas curiosas: Herodes podia mandar matar tantas crianças? Outra, por que
pensar em voltar para a Judéia? Segundo Lucas, eles eram de Nazaré e foram a Belém
só para o recenseamento. Outra é que, também segundo Lucas, quarenta dias depois do
nascimento de Jesus, a Família estava em Nazaré e, daí, eles foram a Jerusalém para a
purificação da mãe e a oferenda pelo filho.
As Comunidades Apostólicas
A comunidade de Mateus é a comunidade cristã de Jerusalém liderada inicialmente
pelos Apóstolos e depois por Tiago, parente de Jesus, conhecido como “o irmão do
Senhor”. É a comunidade berço do cristianismo, a primeira de todas.
Pequenos proprietários da Galiléia, quando perdiam tudo por causa de impostos
e também de juros muito altos, passavam a formar grupos que viviam de assaltos. Eram
chamados de “bandidos”.
No ano 66 eles se uniram, deram-se o nome de “zelotes” e entraram em Jerusalém.
Mataram os Chefes dos Sacerdotes e os outros dirigentes dos judeus, os Anciãos, a
quem deviam e que lhes haviam tomado suas pequenas propriedades. Quatro anos
depois, o exército romano chegou e destruiu a cidade.
Quando os “bandidos” entraram em Jerusalém, os cristãos fugiram. Entenderam que
aquela briga era uma loucura. Decidiram abandonar tudo o que tinham, até mesmo as
famílias, e sair da Palestina. A guerra terminou, no ano 73. Só então começaram a
pensar em voltar, não para Judéia, onde fica Jerusalém, mas para a Galiléia.
Será que a história da fuga para o Egito não reflete o que acontecia com a
comunidade? O que acontece com a comunidade acontece com Jesus.
As comunidades de hoje
Hoje é difícil entender esse espírito de solidariedade e de compromisso com o grupo.
Hoje não iria cada qual tentar resolver individualmente seus problemas? “Cada um que
se vire!”.
Seria possível hoje o grupo tomar uma decisão coletiva de abandonar tudo, até
familiares, e partir para o desconhecido, apenas para estar juntos, unidos e animados
pela mesma fé? Alguém diz hoje que a comunidade é Jesus e que Jesus é a comunidade?
5) O EVANGELHO DOS BÓIAS-FRIAS.
Janela
Só o Evangelho segundo Mateus tem a parábola dos trabalhadores contratados
em diferentes horas do dia. Está no capítulo 20. Jesus fala aí de um proprietário que sai
à procura de trabalhadores para sua lavoura, de manhã até de tarde. Ele os encontra na
praça esperando algum serviço e quando os encontra, manda para sua lavoura.
Ao cair da tarde, manda pagar a diária a todos, a começar dos que só trabalharam
uma hora. Os que foram contratados mais cedo reclamam, pois pensavam que
receberiam mais. O patrão responde: “Não foi uma diária que contratamos? Pegue o que
é seu e vá-se embora. O dinheiro é meu e posso pagar a diária também para os últimos e
você não tem nada com isso!”.
Na parábola, os judeus seriam os que foram contratados mais cedo e os
contratados por último seriam os não judeus.
As Comunidades Apostólicas
Como vimos, a comunidade que nos deu este Evangelho fugiu para o Egito, isto
é, para fora de Jerusalém e até mesmo da Palestina. Deixaram tudo para trás,
propriedades e familiares e foram de aldeia em aldeia, sem saber ao certo para onde
iam. Só tinham uma certeza era o próprio Jesus que os estava enviando pelo mundo.
Iam como missionários em um mundo estranho, como ovelhas no meio de lobos,
mas com uma mensagem certa e definitiva para passar: O Reinado de Deus está
chegando. Sinal do Reinado de Deus era o bem que faziam a todos. Muitos judeus não
concordavam com a idéia de o messias ser Jesus, um crucificado, um “maldito de Deus”
conforme Deuteronômio 21,22-23. E perseguiam a comunidade. Mas os cristãos sabiam
que Jesus havia dito para não terem medo e medo eles não tinham.
Como faziam para sobreviver? No começo ficavam pouco tempo em cada aldeia
e, mesmo sem qualquer recurso próprio, conseguiam hospedagem por um dia ou dois.
Depois, porém, já fora da Palestina, esperavam na praça que algum proprietário do lugar
os contratasse para um dia de serviço. Trabalhavam como “volantes” ou “bóias-frias”.
Um proprietário deve ter entendido que as necessidades dos últimos era a mesma dos
que começaram a trabalhar mais cedo, por isso pagou a mesma diária a todos. Essa
experiência de vida despertou para a mensagem de Jesus, para um significado
mais profundo dos acontecimentos.
As comunidades de hoje
Hoje acontece de a fé em Jesus levar comunidades a fazer como a que nos deu
este Evangelho: Sair (vejam o Papa Francisco dizendo que precisamos sair!) desligados
de qualquer segurança humana, enfrentando a resistência deste mundo vendido ao
dinheiro, para anunciar, como ovelhas no meio de lobos, que o reinado de Deus deve
chegar? Acontece?
Os problemas que as circunstâncias da vida colocam no nosso caminho não
devem ser considerados obstáculos, mas oportunidades diferentes de curar os
sofrimentos humanos e anunciar o reinado de Deus que está chegando. Os
acontecimentos são apelos de Deus, devem iluminar a realidade e lembrar-nos sempre o
que Jesus faria aqui e agora.
6) O EVANGELHO DOS SANTOS REIS.
Janela
Só o Evangelho de Mateus fala da visita dos Magos ao menino Jesus. Não diz
quantos eram, nem se eram reis e, muito menos, dá os seus nomes. Só diz: Alguns
magos do oriente. Mais nada.
Magos seriam os astrônomos daqueles tempos. Havia um conceito: quando
nascia uma pessoa importante, uma estrela nova aparecia no céu. Eles tinham visto a
estrela do rei dos judeus, por isso, foram procurá-lo em Jerusalém.
Eles não eram judeus, eram do oriente, de fora. Só viram uma estrela diferente
no céu e vieram homenagear o rei dos judeus.
Herodes, os sacerdotes e os escribas, os mestres, pela Bíblia sabiam até em que
lugar deveria nascer o Messias. Mas ficaram apavorados com a notícia e Herodes
começou a planejar como matar o Menino.
As Comunidades Apostólicas
A comunidade que nos deu este Evangelho saiu da Palestina e andou por alguns
anos fora de sua terra. Descobriu uma coisa: parece que os não judeus aceitavam a fé
em Jesus com mais facilidade do que os judeus, que tinham a Bíblia e toda a preparação
do Primeiro Testamento. Descobriu também que eles, que não tinham a Bíblia,
possuíam outras maneiras de perceber os apelos de Deus, os sinais do céu.
Daí nasceu a história dos magos, que representam, então, os que não têm a
Bíblia, mas querem encontrar Jesus com mais boa vontade do que os que se acham
donos de Deus.
O desenvolvimento da história dos “santos reis” aconteceu desde os primeiros
séculos. As “Companhias dos Santos Reis” foram criadas para ficar no lugar dos
festejos da deusa Jano, que deu nome ao mês de janeiro. Os festejos eram muito
populares, mas homenageavam uma deusa pagã. O que havia naqueles festejos como
cantorias, danças, visitas de casa em casa, presentes, foi substituído pela visita dos
Magos ao Menino Jesus. Assim se acrescentaram outros detalhes àquilo que diz o
Evangelho.
As comunidades de hoje
Hoje ainda somos capazes de reconhecer que há pessoas que não conhecem a
Palavra de Deus como nós, mas que, seguindo por outros sinais, chegam a realizar o que
Deus quer melhor do que nós? Ou continuamos achando que somos os únicos donos da
verdade? Quem sabe, até, os donos de Deus?
Importante também é a criatividade. Não se contentar em repetir sempre as
mesmas coisas, mas encontrar meios para que a verdade do Evangelho encontre vestes
novas para levar a mensagem a todos.
7) O EVANGELHO DO REINO DOS CÉUS.
Janela
O evangelho segundo Mateus traz mais de trinta vezes a expressão Reino dos
Céus. Umas poucas vezes fala em Reino de Deus. Esse Reino dos Céus seria a
felicidade eterna prometida e esperada?
Não pode ser. Diz, em 5,19: „será considerado o maior e será considerado o
menor no Reino dos Céus?. Maior ou menor no céu, como? No capítulo 13 o Reino dos
Céus é como o semeador que perde três quartos da semente, é como a rede que pega
peixes bons e ruins, é como a plantação onde crescem lado a lado o joio e o trigo. No
capítulo 16 Jesus entrega a Pedro a chave do Reino dos Céus, para ele ligar ou fechar e
desligar ou abrir, aqui na terra, enquanto Deus, no céu, aprova o que Pedro faz na terra.
As Comunidades Apostólicas
A comunidade que nos deu este Evangelho era de cristãos judeus que queriam
conquistar para a fé em Jesus os judeus que não seguiam os Rabinos fariseus e, talvez,
mesmo alguns dos que os seguiam. Para isso cuida muito de não ofender os sentimentos
dos judeus.
No princípio de sua caminhada na fé, Deus era chamado pelo seu nome próprio,
ele tinha o nome de Javé. Mais adiante sentiram que isso não ficava bem, pois ninguém
chama uma autoridade pelo nome próprio. Passaram, então, a chamá-lo simplesmente
de Senhor. Mesmo onde a Escritura traz o nome Javé, na leitura, ainda hoje, não dizem
Javé nem Jeová, sempre substituem o nome próprio de Deus pelo título de Senhor. Mais
perto do tempo de Jesus sentiram que não deviam dizer nem Senhor e nem Deus.
Passaram a dizer “os Céus”, no plural, por uma tendência do seu linguajar.
Reino dos Céus, então, é o mesmo que Reino de Deus. Aliás, nos Evangelhos de
Marcos e de Lucas encontramos „Reino de Deus? onde Mateus diz „Reino dos Céus?. O
Reino dos Céus, então, é o Reino ou reinado de Deus começado aqui na terra, muito
especialmente em Mateus, nas comunidades cristãs. Aí está o joio misturado com o
trigo, aí podem alguns pensar que são maiores do que os outros, mas é o Reino dos
Céus.
As comunidades de hoje
Falta-nos hoje a convicção de estarmos sempre contribuindo (ou não) para o
Reino dos Céus ou reinado de Deus, o governo de Deus no mundo. As nossas
preocupações são quase sempre individuais, pessoais, sem nenhum pensamento voltado
para o coletivo, para a melhoria do mundo, da humanidade, para a caminhada da
história.
Qual o papel da comunidade cristã neste mundo? Colaborar na caminhada do
Reino dos Céus, ser sacramento, isto é, sinal, amostra, e também força na criação de um
mundo novo, de acordo com o pensamento de Deus, Pai de todos. Esse pensamento é
que deveria julgar nossas vidas e nossas comunidades.
8) O EVANGELHO DA PRESENÇA.
Janela
Logo no início, o Evangelho segundo Mateus diz que Jesus realiza, de maneira
toda sua, a palavra de Isaías quando manda Acaz dar ao seu filho o nome de Emanuel,
que quer dizer „Deus conosco?. A última frase do Evangelho é de Jesus aos discípulos:
“Estarei convosco até o fim dos tempos”. Jesus é Deus conosco e conosco estará até o
fim. O Evangelho de Mateus começa e termina com esse pensamento.
Há mais. Na catequese sobre a comunidade dos discípulos (capítulo 18)
encontra-se a palavra de Jesus: “Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, eu
estarei no meio deles”. É a presença constante nas reuniões de grupos e na comunidade
reunida.
Ainda mais. O julgamento final da humanidade toda (25,31-45), de quem
conheceu ou não conheceu Jesus, será a presença dele em todo o sofredor. “Tudo o que
fizestes ao menor dos meus irmãos foi a mim que o fizestes!”.
As Comunidades Apostólicas
A comunidade que nos deu este Evangelho viveu muitos anos em Jerusalém, de
onde só saiu no ano 66, sabendo que não demoraria muito para o exército romano vir e
destruir a cidade e, principalmente, o seu Templo. O Templo era o lugar da presença de
Deus. Ali Javé estava sentado entre os dois querubins sobre a Arca da Aliança,
encerrada atrás de uma cortina no Santo dos Santos, onde só o Sumo Sacerdote entrava,
uma vez por ano. Tudo será destruído pelos romanos.
Deus não estará mais fechado atrás daquela cortina. No momento da morte de
Jesus, o Evangelho diz que essa cortina rasgou-se de cima a baixo. Deus está solto!
Onde ele pode ser encontrado agora? Está em Jesus que é o “Deus conosco”, está no
grupo ou comunidade que se reúne em nome dele, está no pobre e no sofredor e está
com os discípulos até o fim dos tempos.
As comunidades de hoje
Quando o presidente de uma celebração nos diz “O Senhor esteja convosco”,
com que convicção nós respondemos “Ele está no meio de nós!”? Quando a turma do
Grupo de Reflexão parece minguar, o que é que pode dar força e otimismo aos poucos
que continuam firmes, se não a palavra de Jesus: “Onde dois ou três estiverem reunidos
em meu nome...”?
Vemos a nossa vida como um serviço aos irmãos, especialmente aos mais
fragilizados, sabendo que estamos servindo ao próprio Jesus?
9) O PENTATEUCO CRISTÃO.
Janela
O Evangelho segundo Mateus está organizado em torno de cinco falas de Jesus,
alguns dizem cinco sermões, outros, cinco discursos, nós preferiríamos dizer cinco
catequeses, considerando o Evangelho como o mais antigo manual de catequese cristã.
Cada uma das catequeses se encerra assim: “Quando terminou de dizer essas
palavras, Jesus...”. As cinco catequeses são: 1. A Nova Lei (capítulos 5, 6 e 7); 2.
Instruções aos missionários (capítulo 10); 3. Como é o Reino dos Céus (capítulo 13,1-
52); 4. A Igreja ou comunidade (Capítulo 18) e 5. O fim de Jerusalém e de cada um
(Capítulos 24 e 25). Os outros episódios como milagres, discussões, infância, morte e
ressurreição de Jesus só completam e situam as catequeses no todo do Evangelho.
As Comunidades Apostólicas
A comunidade do Evangelho de Mateus, devemos lembrar sempre, é uma
comunidade de cristãos judeus, continuadores da primeira comunidade de Jerusalém. O
objetivo do escrito é conquistar para a fé em Jesus os judeus que não seguiam os
Rabinos fariseus e também confirmar os judeus cristãos em sua fé. Por isso, o
Evangelho todo tem um caráter judeu.
A fé judaica está alicerçada na Torá (Ensinamento), a Lei de Moisés, o
Pentateuco, os cinco livros ou rolos (os livros eram escritos em faixas de pergaminho
em forma de rolo) chamados de Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio. A
fé cristã tem também seu Pentateuco, que resume o ensinamento de Jesus. Aqui todo
judeu está em casa. Jesus não jogou fora a Lei de Moisés, ele a realizou de maneira tão
completa como ninguém ainda tinha feito.
As comunidades de hoje
Precisamos aprender a apresentar nossa fé em Jesus de maneira que as pessoas
de hoje aceitem melhor. Precisamos saber mostrar os lados de Jesus que respondam
melhor aos desafios do nosso tempo. Precisamos ser capazes de agradar, convencer e
também apontar onde estão os verdadeiros problemas de hoje e mostrar saídas.
É necessário desaprender, deixar de lado certas maneiras de falar ou de entender
a nossa fé que nada mais dizem ou dizem absurdos. O Papa teólogo, Bento XVI, já não
mandou esquecer a idéia de limbo para quem morre sem batismo? O Papa Francisco não
se cansa de mandar a gente sair, ir às periferias do mundo, descobrir aí o que hoje é
mais necessário, aprender com o povo, aprender com a realidade, para depois procurar
na fé uma resposta e uma luz.
10) O EVANGELHO DA IGREJA.
Janela
O Evangelho de Mateus é o único que traz a palavra Igreja. No capítulo 16 Jesus
vai construir sua Igreja sobre a pedra que se chama Pedro. No capítulo 18, quem vê
alguém pecando deve primeiro falar com o interessado, depois levar mais um ou dois e,
se não forem atendidos, devem levar o caso à Igreja.
A Igreja é, então, uma organização que tem em Pedro a referência fundamental,
com autoridade para “ligar e desligar”, isto é, excluir ou acolher na Igreja, enquanto, no
céu, Deus confirma o que ele faz.
As Comunidades Apostólicas
Quando o Evangelho foi escrito, os Rabinos fariseus estavam reorganizando o
judaísmo. Era preciso, então, organizar também os discípulos de Jesus fora do judaísmo.
Igreja era, no mundo grego, a assembléia das elites locais para decidir, sob as
ordens de Roma, questões do dia a dia da cidade. Na Bíblia, porém, a palavra Igreja
traduzia o termo hebraico qahal, a assembleia ou reunião do Povo de Deus da Primeira
Aliança. Era o termo mais apropriado para as comunidades dos discípulos de Jesus.
No judaísmo as autoridades eram uma elite, separada do povo comum por
roupas diferentes, por lugares de destaque no culto e nas refeições, pelos títulos de
mestres, pais ou guias.
A Igreja também precisa se organizar e, para isso, distribuir tarefas e funções,
precisa de uma referência principal em torno da qual tudo se organiza. Pedro será essa
pedra sobre a qual se organizará a Igreja.
Ao mesmo tempo, porém, na Igreja tem de ser diferente. O Evangelho de
Mateus recolhe três vezes a mesma palavra de Jesus: “As autoridades deste mundo são
assim e assim, mas entre vocês será diferente”. No capítulo 18,1-5, mandando que se
tornem como crianças, os últimos na escala social. No capítulo 20, vv. 25-28, intervindo
numa briga dos discípulos por poder e prestígio. E, no capítulo 23,8-11, depois de
criticar os líderes do judaísmo de então.
As comunidades de hoje
Hoje não existe isso na Igreja, nunca se viram ciúmes e competição por poder e
prestígio entre pessoas e Movimentos. Ou já?
Disso falou o Papa Francisco aos seus auxiliares mais próximos, os cardeais,
arcebispos e monsenhores da chamada Cúria Romana, em seu encontro com eles no
Natal de 2014. Ali ele falou de 15 doenças da Igreja.
Lembramos a sétima: 7. A doença da rivalidade e da vanglória. Quando a
aparência, as cores das vestes e as insígnias de honra tornam-se o objetivo primordial da
vida, esquecendo as palavras de São Paulo: «Nada façais por espírito de partido ou
vanglória, mas que a humildade vos ensine a considerar os outros superiores a vós
mesmos. “Cada qual tenha em vista não os próprios interesses, e, sim, os dos outros» (Fl
2,1-4). É a doença que nos leva a ser homens e mulheres falsos, e a vivermos um falso
“misticismo” e um falso “quietismo”. O mesmo São Paulo os define «inimigos da Cruz
de Cristo» porque “se orgulham das suas partes vergonhosas e só têm prazer no que é
terreno” (Fl 3,19).